A história das organizações pode pautar e agregar valor às ações de sustentabilidade ambiental, responsabilidade social e governança corporativa
Os fenômenos climáticos anormais cada vez mais frequentes, a pandemia causada pela Covid-19 e a crise sanitária, social e econômica decorrente dela intensificaram os debates que já vinham ocorrendo pelo menos desde os anos 1960 em torno da questão da sustentabilidade. Diante da conjuntura, o conceito do ESG ganhou destaque dentro das mais diversas organizações.
Em pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (ABERJE) em outubro de 2021, o tema ESG estava presente como prioridade em 95% das agendas corporativas dentre as 79 grandes empresas participantes. Segundo dados do Google Trends, entre 2020 e 2022, o termo cresceu dez vezes em buscas no Google.
A memória empresarial é em si um trabalho de ESG, atuando em cada um dos três pilares da sigla, além de apoiar as transformações demandadas pela agenda nos passos de sua implantação.
Neste artigo, você vai compreender o que é ESG e entender como a memória empresarial se relaciona com cada um dos seus focos. Também vai saber como o zelo pela história das empresas pode auxiliar no processo de compreensão, mensuração e comunicação dessas ações. A partir de exemplos de boas práticas, será possível vislumbrar projetos concretos que unem memória empresarial e ESG. Se você tem interesse em saber como, continue a leitura.
Qual a relação entre ESG e memória empresarial?
ESG é uma sigla em inglês usada para comunicar três focos de atenção e de atuação estratégica para as organizações: environmental, social and governance. Menos usada, sua versão em português é ASG que representa a tradução literal: ambiental, social e governança.
A sigla surgiu em 2004, após uma reunião convocada por Kofi Annan, secretário geral da Organização das Nações Unidas (ONU) na ocasião. No encontro, cinquenta CEOs de empresas de diversos ramos de atividade discutiram como o mercado poderia promover mudanças positivas no planeta. A resposta a que chegaram os líderes era integrar à lista de atividades produtivas fatores ambientais, sociais e de governança. Assim, o termo ESG foi registrado pela primeira vez em uma publicação de 2005 chamada Who Cares Wins (Ganha quem se importa) do Pacto Global em parceria com o Banco Mundial.
A memória empresarial pode ser um importante recurso de atuação em cada uma das frentes, agregando valor às ações de ESG tanto em responsabilidade ambiental, como em responsabilidade social e em governança corporativa. Tanto é que, em algumas empresas, os centros de memória fazem parte da gerência de sustentabilidade e ESG, como é o caso do Centro de Memória da Gol Linhas Aéreas.
Confira agora quais as sinergias possíveis das atividades de memória empresarial em cada um dos pilares desta pauta que está cada vez mais prioritária nas agendas corporativas.
Responsabilidade ambiental, social e governança corporativa
Quando a sigla ESG sintetiza os temas environmental, social and governance (ambiental, social e governança), o apelo que se quer dar é para que a sociedade como um todo promova ações de responsabilidade em cada uma destas esferas. Nas empresas, para além do lucro, há uma nova preocupação com o impacto de suas atividades na sociedade, com o legado que deixarão para o futuro e também com a reputação de suas marcas para os stakeholders. Um dos objetivos para o investimento das empresas neste tema é garantir sustentabilidade ao planeta e, consequentemente, longevidade dos seus negócios.
Responsabilidade ambiental
Nesse sentido, algumas ações da agenda E - environmental para garantir sustentabilidade dos recursos naturais e trabalhar pela responsabilidade ambiental são:
combater o desmatamento
apoiar a economia local
controlar os resíduos gerados pela empresa
promover a manutenção da biodiversidade
combater o desperdício
conservar energia
aumentar a vida útil dos equipamentos
A memória empresarial pode auxiliar a agenda E quando a organização dos acervos históricos das empresas racionalizam a guarda da documentação em reservas técnicas com mobiliário apropriado. O espaço físico para acondicionar a documentação organizada é menor e consome menos energia. A temperatura, luminosidade e umidade controladas conservam e preservam os documentos, prevenindo gastos de recursos com restaurações.
Os centros de memória promovem gestão de informação e conhecimento, o que gera impacto ambiental positivo na medida em que evita o acúmulo de réplicas do mesmo documento de consulta em vários setores diferentes. O mesmo processo se dá com os documentos históricos nato digitais, já que a organização dos acervos virtuais economiza espaço nas redes e dispensa a necessidade de cópias salvas em computadores de diferentes colaboradores e parceiros. Melhor ainda se este trabalho de organização dos acervos históricos se der em conjunto com um projeto de Gestão Documental mais abrangente que inclua os arquivos correntes e intermediários.
A Raiz Projetos e Pesquisas de História foi contratada pela Editora Brasil Seikyo para implantar um projeto de zelo com o patrimônio intelectual. Se em um primeiro momento a preocupação maior era com a preservação do legado da editora, logo os benefícios da centralização e organização do acervo histórico nato digital foram percebidos pelos colaboradores. Em uma parte deste projeto, cerca de 4 mil ilustrações digitais foram triadas, organizadas, catalogadas e disponibilizadas para uso de rotina, evitando a necessidade de cada colaborador ter esse conjunto de imagens salvo em seu computador, ocupando memória.
Responsabilidade social e responsabilidade histórica
As ações de S-social são sobre o relacionamento da empresa com as pessoas do seu entorno: os colaboradores, os clientes, os fornecedores, os prestadores de serviço e as comunidades locais.
Algumas ações possíveis de compromisso com a sociedade e que podem compor a agenda de S - social são:
promover diversidade e inclusão
desenvolver e engajar colaboradores
zelar pela saúde mental dos colaboradores e melhorias no ambiente de trabalho
zelar pelos direitos humanos
promover ações de atendimento às comunidades do entorno da empresa
apoiar resolução de conflitos
tomar decisões em prol da sociedade
Há um termo específico cunhado por Paulo Nassar para tratar a responsabilidade social e sua relação com a memória empresarial: responsabilidade histórica. Este termo remete ao momento em que uma empresa compreende o seu papel histórico na sociedade e, a partir de então, promove ações de preservação da memória de suas marcas, produtos e serviços, mas também do contexto mais amplo em que sua atuação se dá.
Afinal, zelar pela memória de uma empresa é cuidar da memória dos públicos que se relacionam com ela: colaboradores, consumidores, fornecedores, moradores das cidades onde suas fábricas e escritórios estão instalados. Preservar documentos históricos empresariais garante também a preservação de documentos históricos sobre um determinado setor de negócio, sobre as cidades onde a sua atividade se desenvolve, sobre a industrialização de um país. O centro de memória da Bunge justifica em seu site o porquê de compartilhar com o público a documentação da empresa:
“Inserida em seu contexto, a documentação conta a história da Bunge, mas também da indústria, do Brasil e dos brasileiros e por isso deve ser compartilhada.”
O Nestlé Centro de Memória, criado para zelar pela memória da empresa privada Nestlé Brasil, emprestou fotografias, rótulos, escritura da fábrica e outros documentos para a Casa da Memória de Araras, um espaço da prefeitura para contar a história da cidade. A compra de uma fábrica de leite condensado em Araras no ano de 1921 é o marco fundador da Nestlé no Brasil e a planta se mantém em funcionamento até hoje, empregando muita gente na cidade.
À luz da pauta S, a Raiz desenvolveu uma pesquisa sócio-histórica para o São Paulo Futebol Clube a fim de iluminar a história que ficou na sombra da narrativa oficial. O estudo sobre a história do clube, do futebol e do bairro do Morumbi, onde fica o estádio do time, revelaram novos protagonistas: os migrantes nordestinos que construíram o estádio Cícero Pompeu de Toledo, a Melânia Luz, velocista do São Paulo, primeira atleta negra a ser enviada pelo Brasil às olimpíadas, a torcida feminina de peso que o time tem.
Governança corporativa
As ações de G - governance são sobre como a empresa é administrada por seus gestores. Algumas atividades possíveis de compromisso com a sociedade que podem compor a agenda de G são:
ter uma política clara de remuneração da sua diretoria
atuar em conformidade com a ética e regulação vigente
oferecer canais de denúncias sobre casos de discriminação e assédio
respeitar os direitos de consumidores, fornecedores e investidores
ter transparência financeira e contábil
ter independência, equidade e diversidade nos conselhos
disponibilizar informações com transparência
garantir fluxos de informação de qualidade
prestar contas de suas ações
A memória empresarial compõe a agenda G quando promove a disponibilização de informações seguras sobre as trajetórias da empresa. Os centros de memória atuam na gestão de informação e conhecimento ofertando documentos históricos comprobatórios sobre as mais diversas áreas.
No Nestlé Centro de Memória, a validação de informações é atividade de rotina. Serve para pesquisar a data de inauguração da fábrica de Caçapava, para saber a data de lançamento do Leite Ninho, quanto foi a produção do ano de 1981, se determinado café foi o primeiro torrado e moído produzido pela empresa, entre outras perguntas como o momento em que a caneca vermelha de Nescafé começou a ser usada como ícone da marca, e até mesmo para saber como a marca Nescau divulgava seu produto nos anos 1930 ou como e por quê foi criado o Leite Moça. Portanto, é sobre saber e comprovar! E a comprovação é feita por meio de dossiês de documentos históricos que reúnem fotografias, comerciais, correspondências, releases para a imprensa, notícias de jornal, relatórios anuais, entre outros.
Reputação e gestão da marca
A reputação é a percepção dos stakeholders sobre as marcas. A sociedade contemporânea está cada vez mais consciente sobre a questão da sustentabilidade e exige compromisso das empresas com o assunto. Por isso, se tornou um fator essencial para manter a competitividade no mercado.
Dessa maneira, investir em sustentabilidade e na agenda ESG significa ganhar em reputação, o que, por sua vez, ajuda na captação de investimentos, na fidelização de clientes e fornecedores e na expansão de negócios.
A Zodiac Farmacêutica teve um ganho de reputação por meio do resgate da sua memória e a comunicação das suas ações de responsabilidade ao longo dos 30 anos de atuação no mercado brasileiro. Em parceria com a Raiz, foi realizado um projeto de extroversão de acervos. Painéis expositivos foram instalados na sede e na fábrica, um livro foi publicado e distribuído aos colaboradores e parceiros e palestras sobre memória empresarial foram ministradas aos gerentes e à força de vendas. Estas ações foram inclusive inseridas no relatório de sustentabilidade da empresa, que entende que a memória empresarial é parte integrante do ESG.
Cultura organizacional
A cultura organizacional é composta pelo clima, pelas práticas, símbolos, hábitos e comportamentos, pelos valores éticos e morais, pelos princípios, crenças, cerimônias, pelas políticas internas e externas, pelos sistemas e pela linguagem própria de uma empresa.
A governança corporativa tem uma influência direta na cultura organizacional, já que unifica os processos da empresa. Quando a governança funciona bem, colaboradores, fornecedores e prestadores de serviço executam as atividades em uma mesma sintonia, compartilhando da mesma missão, visão e valores.
Para integrar um projeto de construção de cultura organizacional de um escritório de advocacia, a Raiz desenvolveu uma pesquisa sócio-histórica sobre o universo jurídico no Brasil. Neste projeto, foram descobertas as camadas de construção histórica do repertório cultural da profissão, o que gerou insights pertinentes à reestruturação do escritório.
Memória empresarial a serviço da agenda ESG
Agora que está mais clara qual a relação entre memória empresarial e ESG, é preciso saber como começar. Segundo Leonardo Dutra, sócio líder de serviços na área de Mudanças Climáticas e Sustentabilidade da Ernst & Young para o Brasil, os primeiros passos são entender quais os pontos de ESG conectados à atuação da empresa no mercado, medir a maturidade da empresa nos temas selecionados, e mapear os maiores gaps e comunicar aos colaboradores, fornecedores e clientes as ações a serem tomadas na direção das metas de ESG que a empresa determinou para si.
A memória empresarial, além de ser um meio em si de atuar pelo ESG, também é muito relevante nas etapas de implantação, já que:
revisitar a trajetória da empresa é fundamental para entender os temas da sigla que mais se conectam com sua identidade
conhecer a história é uma maneira de medir os pontos do ESG que mais impactaram o negócio ao longo de sua trajetória e onde estão os maiores atrasos e falhas nessa agenda
é preciso conhecer os impactos positivos que a empresa já gerou para a sociedade para comunicar as ações e os pioneirismos de cada marca ou empresa sobre os temas de ESG
Um caso representativo de como a memória empresarial ajudou a comunicar ações de ESG ao longo da história é um vídeo institucional da Granado, empresa brasileira de produtos cosméticos, medicamentos e perfumaria, fundada em 1870. Nele, a Granado conta sobre a sua fundação e sua trajetória, além de trazer informações sobre ações pioneiras em benefício da sociedade, tais como a plantação própria de matérias-primas, o uso de glicerina 100% natural e a suspensão de testes em animais.
Tendo em vista a amplitude e complexidade do tema, é importante contar com profissionais especializados em memória empresarial para promover ações que se encaixem de maneira adequada com a agenda ESG. A Raiz Projetos e Pesquisas de História possui ferramentas, técnicas e habilidades específicas, além de experiência para auxiliar sua empresa. Se interessou em começar um projeto de ESG com o apoio da memória empresarial? Fale conosco!
Perguntas e Respostas
Como a memória empresarial pode contribuir com ações de ESG?
A memória empresarial é um importante recurso de atuação na agenda ESG tanto nas ações de responsabilidade ambiental, como em responsabilidade social e em governança corporativa, porque o resgate da história das marcas, a organização e a extroversão de acervos podem impactar diretamente em cada uma das três frentes do ESG.
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